As violentas imagens distribuídas
nas redes sociais e em grupos de troca de mensagens, mostrando o espancamento (pra
ser generoso no termo) de um “torcedor”, foram chocantes, mas estão enraizadas
em todo país, não só em Pernambuco. O que há de comum em todos os lugares é que
tudo isso ocorre com o consentimento do poder público, mas não só dele. Isso acontece
há muito tempo, um erro crasso que não foi corrigido no passado. Entram e saem
autoridades e nada é feito de concreto para que fatos como esse não ocorram e
isso segue minimizado pelo desconhecimento da realidade. Vincular a violência
gratuita que os “torcedores organizados” espalham país afora com o futebol é
uma grave distorção. Esse erro é repetido pelo Estado, durante muitos anos
pelos clubes e em algumas vezes pela imprensa.
Particularmente, não reconheço
essas pessoas como torcedores de futebol, visto que eles se igualariam a mim e
a outras pessoas que são apaixonadas pelo clube de coração e que vão ao estádio
única e exclusivamente em busca de emoção. Aliás, acho que eles nem sabem o que
é futebol, muito menos quem é o artilheiro da equipe, o jogador com mais
partidas com a camisa do clube ou o adversário da partida seguinte.
Esse assunto sequer deveria estar
aqui (ou em qualquer página esportiva), eu deveria escrever sobre FUTEBOL, só e
somente só. Inclusive sobre o jogão que Recife presenciou (Sport 5 x 3 Santa
Cruz), mas que foi ofuscado pela violência desde cedo nas ruas da capital
pernambucana. Não era pra você estar lendo isso, porém pela repetição dos
acontecimentos o posicionamento é necessário e obrigatório. Preciso escrever sobre
isso! Mais uma vez! O que aconteceu no último Domingo não é algo novo,
espancamento de “torcedores organizados” por “torcedores organizados” é algo
absolutamente comum na cultura da barbárie estabelecida por esses grupos há
muito tempo. É absurdo, chocante e desumano, mas não surpreende. A verdade é
que, as imagens que vimos chocam aqueles que não integram esse contexto, onde
há um inversão de papéis entre vítima e agressor.
Domingo, pelos boatos espalhados na
internet e depois confirmado oficialmente, o espancado era o presidente da
Inferno Coral, a maior “torcida organizada” do Santa Cruz. Ontem soube-se que
um possível membro da Torcida Jovem, uma “organizada” do Sport Recife, com o símbolo da mesma
tatuada no peito, teve os olhos arrancados por golpes de faca. Revide ou
casualidade? Impossível atrelar uma coisa a outra? Entendo eu que esses fatos
estão direta ou indiretamente ligados ao contexto que rege esses grupos e ainda
assim eles fazem o possível para negá-los ou minimizá-los. O Governo é um dos
principais culpados por essa situação, por vários motivos, entre eles: sempre
ter tratado o caso de forma superficial, não ter controlado os fatos com mais
veemência e nunca ter buscado as verdadeiras raízes desses ocorridos.
O que fazer?
Admitir o quanto isso é
preocupante e grave não é tardio, mas o principal era tratar como
prioridade, uma estratégia de segurança pública para coibir e acabar com esses casos e isso seria apenas o ponto de partida. Sinceramente, sabemos que isso não vai acontecer
nesse século. O que sempre ocorre no dia seguinte aos fatos ocorridos são as
mesmas ações paliativas, superficiais e inócuas. Desde que comecei a
ver essas cenas, pela TV e ao vivo, do que esses “torcedores organizados” são
capazes de fazer e a cada novo ocorrido, sinto que já se perdeu o controle sobre isso há
muito tempo, pior, o controle por parte do Poder Público não vai ocorrer. As
privadas arremessadas das arquibancadas do Arruda, foi mais um fato chocante que ocorreu, mas ficou no esquecimento, será necessário algo pior para que as “autoridades”
despertem e façam algo. Chego a acreditar que a vontade do Poder Público é que esses grupos se digladiem cada vez mais
e que se matem por vontade própria. Tento sinceramente entender e não consigo,
porque proibir que um bumbo entre no estádio, mas o cara que toca ele e que
briga dentro do estádio, não fica proibido de entrar. Proibir que a bandeira
entre no estádio, mas o cara que usa o pau da bandeira pra atacar o outro entre
normalmente no estádio. Pior, proibir a entrada dos “organizados” com camisas que
os identifiquem, mas não proíbe o cara que briga descaradamente na frente das câmeras,
de entrar no estádio. Não consigo entender, será que meu QI é tão baixo assim?
Não acredito que chegaremos no
nível britânico, quando o Estado com a então Primeira Ministra Margareth
Tacher, interviu na violência que os hoolingans espalhavam nos estádio ingleses
nos anos 80/90. São realidades totalmente diferentes, mas enquanto não houver uma
dura intervenção, nada mudará.
O fato é que, para uma possível mudança
dessas situações, é preciso a total desvinculação desses grupos com o futebol e a
proibição dos mesmos frequentarem os estádios com seus símbolos, cânticos, etc. Tolerância
zero a todos eles, impedir a presença física dos mesmos é parte fundamental do
processo para que não se multipliquem cada vez mais. O que eles fazem nas arquibancadas
funciona como isca para atrair mais adolescentes em condições de
vulnerabilidade social. E mais, tirá-los do estádio significa diminuir o vínculo
deles com o futebol.
E os clubes?
Para que essa vinculação diminua, cabe também a cada clube fazer a sua parte.
O Sport serve como referência, a partir do
momento que seu presidente assumiu a corajosa postura de distanciar ao máximo do
clube a principal “torcida organizada”. Conseguiu avanços, porem eles seriam
maiores se o Estado fizesse sua parte.
O Náutico, outra equipe pernambucana
conseguiu diminuir a relação com a principal “organizada” do clube, ainda que
não tenha sido o total rompimento, a imprensa comenta que essa relação foi
bastante abalada.
No Santa Cruz, parece que isso está longe de ocorrer,
principalmente quando se vê os representantes (presidente, vice,
diretores) assistindo aos jogos nas arquibancadas do Arruda a
poucos metros da maior “organizada” do clube, inclusive, fizeram isso no
Domingo na Ilha, depois dos atos ocorridos mais cedo. É uma cena que, eu particularmente, considero
errada pra não ser mais desrespeitoso a eles. Por todos prejuízos financeiros
(depredação do patrimônio ao retirar as privadas e joga-las), técnicos e morais
que a “organizada” causa, a Direção assistir jogos ao lado desse pessoal é
manchar a imagem de quem está a frente do clube e do próprio clube.
O que os clubes fazem de fato? Nada!
Transferem a responsabilidade dos crimes cometidos por esse pessoal para o
Estado, ou seja, lavam as mãos.
O que o Estado faz de fato? Nada! Também não
faz a sua parte e o ciclo de violência continua pior, se multiplica cada vez
mais, aumentando os níveis de crueldade.
A única coisa certa nisso tudo é
que a culpa não é do futebol!
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